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Sons e silêncios

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No último post referi um texto de Paulo Varela Gomes na sua habitual coluna do Público “Cartas do Interior”. PVG é um autor com o qual me identifico (suponho que seja uma mistura de sintonia ideológica e geracional), com o qual partilho muitas ideias e é leitura imprescindível aos sábados.  Não me surpreende a qualidade da sua escrita e a renovada originalidade dos temas que aborda, mas quando pensava que neste domínio nada me conseguiria afastar desta expectativa cómoda a que me habituou, eis que uma série de artigos em que aborda, mesmo que de forma por vezes indirecta, um tema que me é particularmente caro —o som e o silêncio— me vem desassossegar .  Recomendo a todos os que se interessam por esta matéria a leitura da crónica de 19/11, justamente intitulada “Silêncio”, a de 26/11 (já referida no post anterior) intitulada “Angelus” e, finalmente, a de 10/12 intitulada “Tempos Mortos”.  Raramente os autores da minha área da comunicação acústica têm uma visão tão límpida sob

Sobre os sinos

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Uma edição da série Encontros com o Património dedicada aos sinos. Chama-se “Os sinos - outros sons, outros tons” e constitui uma espécie de relatório do estado da arte sobre tudo o que diz respeito aos sinos em Portugal. Ouça aqui , é imperdível. Este programa surge, curiosamente, mais ou menos no momento em que Paulo Varela Gomes escreve na sua habitual crónica do Público um Angelus (“Cartas do interior”, 2011/11/26) sobre sinos. Fala num “tempo dos mercadores”, construído “à medida que deixamos de ouvir o som antigo dos sinos, que só aos velhos faz hoje semicerrar os olhos, baixar a fronte e suspender por um instante o vazio do tempo.” “Não há coincidências,” dizia-me um dia uma amiga muito querida. Este texto não poderia ilustrar melhor o programa da TSF. Não pode ser coincidência... NB- A foto que ilustra o post foi retirada de uma reportagem da RTP sobre a Fundição de Braga, uma das mais antigas fábricas portuguesas de sinos.

Viver ao vento

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As actividades humanas que se exercem em comunhão com o ambiente que nos rodeia dão-nos uma perspectiva muito rica da realidade. Uma reportagem recente da TSF (inserida na rubrica “Ouvir e verão”) dava conta de um moinho ainda em funcionamento na região do Bombarral.  Os moinho são destas tecnologias que vivem do ambiente e devolvem o que lhe cobraram com uma preciosa mais valia. Os moinhos utilizados para a moagem do grão são máquinas impressionantes, belas e perfeitas na economia e na eficácia do seu funcionamento, admiráveis na forma harmoniosa como servem o seu propósito. Os moleiros são seres que, de forma consciente ou não, reflectem tudo isto e revelam, no meio de todo este complicado fluxo de energias benfazejas, uma serena mas profunda sabedoria.  O som tem um papel crucial no modo de funcionamento dos moinhos. Internamente qualquer peça revela a correcção do seu funcionamento pelo som que emite. O moleiro sabe ouvir e descodificar o som dos mecanismos do seu moinho.

Com o coração

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Ouço na rádio, enquanto conduzo o meu automóvel de volta a casa, o novo Bispo de Bragança-Miranda, José Manuel Garcia Cordeiro. Diz que vem,  sobretudo, escutar . A frase suscita-me maior atenção. “Não com o ouvido,” acrescenta e esclarece, “mas com o coração.” Chego a casa e assisto logo de seguida a um magnífico documentário sobre Alberto Korda, o fotógrafo cubano, o fotógrafo do Che e da Revolução.  A propósito de fotografia e do ensino desta arte, no derradeiro plano deste documentário, enquanto se vê Korda a sair de casa com a sua Canon, ouve-se a sua voz, citando uma frase de Antoine de Sainte-Exupéry do “Principezinho” dizer: “para ver , verdadeiramente, temos de o fazer com o coração.”  Um coração (esse orgão que parece fazer tão bem a síntese audio-visual), duas maneiras de sentir o mundo à nossa volta. Duas maneiras de tocar o divino.

Reforma e paradiddles

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Acabo de ver a actuação da Freedom Band de Chick Corea, no “Jazz à Marciac 2010”. A banda inclui Kenny Garrett, Christian McBride e Roy Haynes.  Que dizer desta música e destes músicos...? Tudo isso está de tal maneira para além de quaisquer palavras que me limito a destacar, por razões que esclareço adiante, o baterista Roy Haynes.  Pena este extracto do Youtube, que indico aí em baixo, não conter a dança final que Roy Haynes executa perante os colegas incrédulos e um público em perfeito delírio, mas ficam, pelo menos, com uma ideia da aura absolutamente esplendorosa deste Roy Haynes, a vender energia e a “estragar” a noite aos seus colegas, dois deles bem mais novos.  Ver este homem, com 85 anos na altura em que escrevo, a tocar assim deveria fazer parte de qualquer programa de recuperação da crise económica. Seria, por exemplo, inspirador passar esse seu solo neste concerto nos ecrãs das repartições da Segurança Social. A ideia de reforma —sobretudo, antecipada— parece-me tão

Não ouviu

Um homem de 88 anos morreu no Entroncamento, colhido pelo Alfa. Segundo o Público , pessoas presentes na plataforma terão tentado avisá-lo “ para não atravessar naquele momento,” mas o homem não ouviu. Usava um aparelho auditivo. O velhote tinha acabado de chegar de uma visita à filha e atravessava a linha para apanhar a sua bicicleta.” Não ouviu os avisos emitidos pelos altifalantes da estação, não ouviu as pessoas que o tentaram avisar, não ouviu o comboio aproximar-se. Não ouviu.

Sound design, marketing ou tontice?

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Entro no supermercado e dou de caras com esta preciosidade: uma marca de batatas fritas convida-me — em tom familiar e “tutuando-me” — a “fazer sandes com barulho!” Como durante muitos anos me dediquei a fazer cumprir as regras para prevenir o incómodo do “barulho” tive, confesso, um arrepio. Não me parece ser esta a melhor forma de sensibilizar as pessoas para a enorme importância do som na nossa vida, nem particularmente excitante esta nova técnica de design sonoro. Por outro lado, o truque de marketing vem provar, sem margem para dúvida (para quem tenha dúvidas...), a importância do som. Os promotores de vendas —que actuam em território certamente seguro e testado— não hesitam em explorar este filão. E fazem-no a um nível muito sofisticado, atingindo um ponto nevrálgico. Talvez então o marketing possa ser um aliado. Perverso, mas eficaz...  Pergunto-me se estes estariam interessados em financiar uma campanha de higiene auditiva. Imaginem, por exemplo, sobre os malefícios d

“Vermelho da cor do céu”

Uma reportagem de Ana Catarina Santos e Luís Borges da TSF para ouvir aqui . Sobre a cegueira total feita através de um medium “cego”. Um achado!

Perdão de Natal

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O Primeiro Ministro actual não é personagem sobre o qual recaem as minhas particulares simpatias. Tenho-o aliás demonstrado com a frequência possível num outro blog para o qual escrevo. Mas, noblesse oblige , não posso deixar de assinalar a referência que fez ao ruído e o destaque que deu a esta questão durante a recente apresentação do Nissan Leaf. Em vez de esquecer esta característica ambientalmente positiva do novo veículo, ou de a deixar escondida no meio das outras (emissões de CO2 e consumo energético), Sócrates colocou o ruído em primeiro lugar (eu ouvi!) por duas vezes no seu discurso. Num período em que, ele próprio de maneira não despicienda, contribui para o enorme ‘ruído’ que por aí vai, chamar a atenção para um problema ambiental grave e mostrar uma solução real para o combater, constitui um acto que requer (neste caso, sim!) alguma coragem.

Televisões portuguesas: o horror à música

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Os portugueses serão menos musicais que os outros povos? Gostarão menos de música? Praticarão menos música per capita ? Será a sua estrutura neurológica diferente da dos outros povos, no que respeita às zonas dos seus cérebros que reagem ao fenómeno musical? A música fará menos parte do seu dia a dia? Estarão menos interessados do que os outros pela música que se faz fora do seu país? Estarão, perguntaria mesmo, menos interessados na sua própria música e na dos seus músicos do que os outros povos demonstram estar pela sua própria? Estas e outra perguntas acodem-me à mente quando, de repente, tomo consciência que não vejo um programa de música nas televisões portuguesas há muito, muito tempo. Não me refiro a essa imbecilidade dos programas dos tops . Nem me refiro aos músicos que vão tocando nos pouquíssimos programas que têm uma banda residente. Refiro-me aos concertos, aos programas gravados em estúdio, às séries de música, aos especiais de música, em especial os que envolvem músic